25 maio, 2008



Ausência


A fumaça

eis-me a única fidedigna

companheira...

Suplico por ti

Minha retina já fora

Afetada pelo glaucoma

Do qual não sou portadora...

Por isso, vasculho as encruzilhadas

das ruelas e não enxergo...

Onde estás?

Necessito-te...

Calada afônica

Berro chamo teu nome

Sobrenome... urro uivo... murmuro;

Dói a tua não existência nas

Veias que percorrem meu

Cadáver sem artérias...

Vida sem arte

Cena sem sangue;

Quero-te

Este querer tórrido

Transforma-me torta...

Nua alma pura crua

Feto para ser moldado

Pelas mãos de ti - meu domínio.

Sufoco submersa na falta,

Não há destino em meu percurso

Sem o meu AMOR!


BM


Recado


Aquieta-te moça...

Podes ficar tranqüila

Já não me iludo mais.

Fartei-me de tantas pilhérias

Estou aqui séria

Inteira

Intensa...

Porém, não me tenha tola,

Não, não criança,

Não sou boba...

Tenho auréolas duplas

Nelas algemaria teus

Calcanhares de Aquiles.


BM


Valsa


Disseste-me tu - "Sou toda tua..."

Já seria minha a alma cujo

Neste corpo achara o habitat,

Adormecida em um repouso lúgubre?

Minha haveria de ser a boca na qual

Perdi o fôlego no beijo eterno?

Sou eu a dona desta dançarina

Bailarina brincando sobre

Aquela caixa de música?

E o encontro mágico daquelas

Personas sedentas cálidas...

Por séculos esperava a nobre dança,

Que não era uma reles valsa

Ou um sonho de valsa.

Éramos o embalo ritmado

Ao suor que escorria pelas peles...

Partes desnudas deslizavam

No som suave dos gemidos nossos;

Por fim, fundimo-nos UMA.


BM



12 maio, 2008



Proêmio – Diálogo

- Meu pai perguntou por você quando fomos à soverteria. (diz ela)
- (Sorrindo) Ah, ele não poderia esquecer. (respondo)
- E a sua mãe, perguntou? (retruco)
- (Silêncio, olhos marejados) Não, minha mãe não perguntou. (roufenha ela)
- (Mudança de assunto)
- Levanto e vou apanhar algo para beber. (Choro)

Fidedigna Dama

À memória de JUAREZITA DE SCHUELER
(Filha Dedicada, Mulher Célebre, Dama Marital, Mãe Perfeita e...AMIGA de mãos e colo receptivos... absurdamente Intelectual).

Cheguei tarde à vida tua...
Nos anos que seriam últimos.
Não! Cheguei cedo, melhor, na hora exata,
Tu estavas tão bela naquele dia
De uma beleza sublime, celestial – digna de uma nobre Rainha.
Recostada à cabeceira de tua cama,
Era a primeira vez que eu sentara aos pés dela.
Ouvia-te, deveras sedenta do que havia a me dizer – ensinar.
Tua alcova era de um requinte à altura
Daquela que parecia uma Dama Medieval,
Em cujas madeixas louras (como eram lindos os teus cabelos – ainda que não penteados)
Pele alva, mostrara a celebridade das antigas figuras que ilustravam a Literatura.
Mas tu não eras personagem,
Foste filha, esposa, mãe e não obstante
Progenitora de frutos bem criados.
Companheira de um homem simplesmente feliz;
E amiga de tantos, que contigo muitas coisas viveram,
Tantas outras aprenderam.
Por horas a fio a escutavam, incansavelmente.
Saiba que me falta uma pena de ganso,
E o tinteiro da Margarida Goutier
Para rabiscar algumas, que verdadeiramente
Deveriam ser todas, jamais tolas
Laudas que compunhariam um livro
Sobre as poucas e preciosas tardes, manhãs, noites
Em que trocávamos palavras;
Hoje, resta-me de ti apenas uma carta,
Esta, que já na época me arrancara lágrimas,
Agarro-me a ela para sentir
Em um plano qualquer a suavidade
Das mãos que escrevera...
A isto, defino – Saudade!
Flor ululante nas areias de uma Icaraí
Que jamais será a mesma;
Foi-se contigo um fragmento de mim...
Descanse na paz da qual és merecedora.

BM





Sobre – vivente

Cegaste-me a boca
Calaste-me os olhos,
Rasgaste a Luz que
No ventre trazia
Para que adentraste
Perfeita jóia rara
Paixão sombria
Cujas pupilas fulminou;
Só em ti, apenas por ti
Ainda pulsa este
Coração que abandonou
A vagabundagem na
Esquina de tua rua...
Algemaste minhas artérias
Aos punhos teus...
Ando Alice no país da
Fantasia, completamente
Arrastada por este amor...
Latente – em nossa cama ardente.
Sou sobrevivente tua.

BM


Descaso

Só faltara o altar
De resto, o límpido
Marmóreo de teus
Dentes reluziam no
Piso há muito não varrido.
Tu, que de mim te esquivas
Pelas frestas do nosso barraco
De palhas secas...
Eu, que a ti busco incansavelmente
Tal como os idólatras lastimáveis
De um romantismo há tanto
Extirpado...
Mas em minhas veias ainda
Corre sangue de nobre rapsodo
Ou de uma fajuta plebéia;
Agora, meu amor, a tinta secara
E tudo brilha como os olhos teus...
Porém, ainda resta o altar.

BM

Rastro

Olho o azul celeste daquele
Cinzeiro que tu seguraste
Durante todo o tempo em
Que estiveste ao lado meu...
Passo a mão nos adornos,
Meus olhos míopes só
Contemplam três baganas
Deixadas por ti
Antes de ir em má hora...
Foste, fiquei ... tormento.
Teu pijama sobre meus lençóis
Cujo olor de nosso desejo ainda
Permanecia...
Amor, cheiros...
Meu gozo, teu êxtase.
Agora, o que tenho eu?
Além da nicotina queimada
Que me sobe às narinas
Sem permissão...
As cinzas abraçam meu
Corpo – insone.
O que ontem era brasa
Hoje é somente o rastro teu...

BM



Poema Histórico

Estou preenchida pelo que
Não possuo;
Nesta mesa de um mármore já envelhecido
Meu rosto não reflete - é homônimo.
Nos lábios, meus caros, trago
Sal, não o do mar de Copacabana,
Mas os das salinas quase que
Cristalinas.
Não me beijes, deves proteger-te
Do veneno que a Cleópatra me
Deixara com herança.
Não me olhes, machucar-te-íam
As chispas que fulguram de
Minhas pupilas.
Jamais me ames;
Sou a víbora
Que levara a vida
Da Rainha do Egito.

BM



09 maio, 2008



Enjaulada

não...não vou...
Estacarei aqui meus pés
Por mais que gritem a lugar algum
Dirijo-me, é perigoso, posso peder
A direção.
Pender-me-ei, pendurada...
Encarcerada, com uma dessas máscaras
Que não seriam as teatrais, nem as de uma
Veneza há muito perdida,
As de ferro, aço.
Receio que me grude à face,
Mas não é a hora de meu ego falar...
Se agarrar à pele a humanidade estará
Protegida.
Portanto, a fera tem de estar
Na jaula.

BM



In-Tensa

Mato-me, morro-me
Matar-te-ía?
Talvez a sufocaria
Ao ponto de ficar
estarrecida, de olhos
esbugalhados, assim como
os de uma linda noiva enforcada...
Só mataria a ti de amor,
Não por amor...
Deixar-te-ía sem ar
Em um beijo longo e
Molhado que nos levaria
Ao mundo mais aquático
Nunca noutro tempo visitado...
E a sereia de formas
perfeitas e cauda lilás
Jamais de meu mar libertaria.
Quisera eu ser pioneira
A desbravar estas sendas
Devorar com astúcia tuas fendas,
Explorar cada parte até beber
A última gota de sangue.
Se fosses virgem, me propunha
A ensinar-te tudo o que
Não domino, o desconhecido;
Criaríamos a serenidade perpétua
Cujas chaves estariam no regaço teu...

BM

07 maio, 2008



Feromônio

Só sabia que ia ao encontro teu
Nada mais era de meu incauto conhecimento...
Questionava-me na longa viagem,
Como amar um ser que nunca vi?
Tocar trêmulo a pena e fazê-la
Deslizar pela fêmea cujo
Paladar me era misterioso...
Cometer poesias para um amor no escuro.
Segui pela rampa íngreme de minhas
Duras jornadas, tal como um cão
Em busca daquela que exala o cio.
No ato em que fitei os olhos profundos,
Achei uma dama sem o vagabundo...
Tão delicada como a seda onde
Teu corpo ressona em brasa serena.
Ora menina, ora mulher...
Ora no picadeiro, ora diligente...
Antíteses constroem este ser tão pleno...
Que por horas me chamaste, uivando
Só, nas madrugadas insones,
Hoje, me deixaste, ondeante, cão domado.

BM

04 maio, 2008



Proposital

O trem saira dos trihos...
Tu te levantas a tempo...
Enquanto passara o veículo
Tão devastador
Não, nem deitaste teu corpo
Longinquo onde faço meu
Trajeto de rotina.
Manter os pés no chão...?
Desconheço essa oração,
Aliás todas, nunca fui boa em sintaxe.
Tu amarras teus pés ao bruto da pedra
Eu leviana levito lunática __
Perfeita idiota _ como sempre fui,
Certamente cabulara as aulas de astúcia.
Ou nem tenha feito esta disciplina.
Seria esta tua milésima vez?
Mais uma dor? Menos um amor?
Se és proposital, sáia da redoma...
A navalha só fere meus membros
Jamais a dividiria contigo...


BM