06 outubro, 2007





“Por enquanto eu morri, vamos ver se renasço” C.L.

Suicidada

Agora está decidido,
Vou cortar as unhas,
Não as pintarei mais de carmim,
Rasparei as melenas,
Não as deixarei mais azeviche,
Serei ruiva na certidão,
Incompleta de nascimento,
Perpétua pelo destino,
Carregarei minha cruz,
Se me deram este peso, eu suponho
Que devo suportar.
Não rasgarei mais meus membros,
Golpearei as poesias que correm soltas
Envenenadas como o sangue
Contaminado de nossas veias.
Não matarei a ti, pois morrerás comigo.
Não tomarei mais cicuta com a validade vencida,
Brindaremos cianureto em meu velório,
Fugirei das mesóclises, não sei usá-las mesmo.
Minhas orquídeas, despetá-las-ei...
Tenho raiva delas, tenho asco de mim,
Tenho amor por nós,
Por isso, me odeio.
Por isso, amo-te.
Posto que tu és luz,
Enquanto eu sou sombra,
És alva,
Enquanto eu de nacionalidade duvidosa.
És nobre,
Nada além de uma plebéia sou...
És culta,
Nem tenho gramática.
És poeta,
Sou verborrágica.
És vida,
Sou a urna clemente onde
Deitarei ao som de Fédon,
O cadáver há muito falecido.

BM.





Suplícios


Já não são mais somente três vezes,
Que clamei por ti.
Em meio as noites desatinadas de meu percurso
Torto, tonta eu já perco as contas.
Já não são mais três os morfemas
Que grafam minha infelicidade,
Rascunharia a face por tanto descuro.
Em tão alto grau quis assassinar-te,
Mas não posso me valer do pretérito,
Posto que me seja imperfeito,
Valho-me do agora e nunca,
Do quanto quero tê-la morta
Em meus braços, da vontade
Que me invade o peito, me crava os pulmões
Já pleuríticos, de ter emergido teu corpo
Já sem vida desta lama, poltronice na qual
Imergiste, e me parece sem volta.
Sinto eclodir em meu peito que não é proláptico
A avidez de te presentear com o mais belo
De minh’alma – tua morte.
Assim, poderia roufenhar baixinho
Ao pé de teu ouvido cadavérico:
- Acorda, Alice.

BM.