30 novembro, 2006



“fiquei definitivamente adulto,cansado pelos dias que me obrigo a viver consola-me a escrita correndo livre nas imensidões do deserto.” Al Berto


Porta da Loucura

Sentia-se terrivelmente
Exausto pelos dias que a vida
Lhe impunha.
Assim como tu, Caríssimo, meu eu-lírico,
Outrora garoto travesso,
Cansaste das manhãs
Que o sol irradia em tua janela
De vidro trincado, e pingos da
Chuva de um verão impuro.
Ainda assim, levanta,
Sorriso nos lábios,
Alma exaurida,
Cabelos penteados,
Mente amnésica,
Corpo ereto,
Espírito aos farrapos.
Transeuntes, milhares aos redores,
Mesas, copos, cigarros,
E a solidão perpétua,
Fantasmagórica em tua carteira,
Tal como um documento necessário.
Meu menino parava diante
De uma porta,
Mogno vínico,
Chaves e fechaduras
Em ouro branco,
Adornada por um marfim
Quase suave,
Estava ele,
Em frente à tua maior in-sanidade.


BM.




Homicídio

A luz se apaga,
Ela grita,
Alto, em desatino,
Depois,
Surda, afônica,
Roufenha...
Amor, amor, agora...
Agora, não!
Antes, mais rápido,
Urgentemente.
No passo, o presente já
É tarde para viver
A véspera é pretérito mais que imperfeito
E o futuro, este, jamais acontece
Aos pés de um leito,
À borda de uma urna,
À beira de uma sepultura.
Molestada, ainda pede,
Súplice,
Implora – amor, amor.
Dúvidas da existência desta quimera!
Seu corpo lanhado
Acende as chagas aos arrepios
Das mãos que já o tocaram.
Não, agora,
Amor é fotografia queimada,
Livros roídos,
Charuto na guimba...
Versos manchados por lágrimas
Que hoje já secaram.
Círio de pavio consumido.
Amanhã, talvez, no jazigo esteja
O amor que tanto desejara.

BM

29 novembro, 2006


Clamo-te
Venhas até aqui, bela,
Aconchegues teu corpo exaurido
Nos ombros meus.
Repouses teu cansaço,
Ouças essa pulsação
Constante do peito
Que arfa de emoção ao lado teu.
Deites tuas melenas de fios ruivos
Em meu regaço, molhe meu seio
Com teu tormento.
Afogue-me neste pranto
Incessante,
Já é tarde, meu amor,
Mas não é tarde para o amor.
Fale-me,
Digas o que te vens à mente
Sem hesitares.
Mesmo que teus lábios tragam fel
Beije-me a boca,
Morda-me a carne,
E depois, declames Al berto,
Quiçá "Morte de Rimbaud",
Ou "Meu único amigo",
Se quiseres até Equinócios de Tangerina...
Ou, apenas fale-me de uma Ode
Que certa vez uma poeta cometeste
Ao adentrar numa caverna
E dela jamais sair.
BM