22 julho, 2006


Àquela


Desta por quem tenho amor,
Recebo, o indizível,
O impagável,
O excêntrico.
Sentimento surreal,
Repleto de uma malvadeza tão terna,
Que me chega a ser branda,
Feito as flâmulas dos faisões
Nas maças levemente coradas
Daquela que ressona reclinada
Ao tronco de arvoredos
Em parques já desmatados.
Aquela me dói,
Me traz à tona todas as alegrias
Um dia cauterizadas de forma
Tão perversa...
Me foram abortadas ainda embrionárias.
Por ela, minhas entranhas são corroídas,
As faces manchadas pelos córregos e kajais.
Quando a possuo, sinto pulsando em mim,
O sangue de veias já trocadas.
Sou acometida por um semblante
De um branco saciado, quase marmóreo – meus dentes,
Sorrio.
Oferto aquela que amo,
Toda a minha juventude já envelhecida.
As mãos gélidas, porém ávidas.
Os olhos escusos, que ainda piscam.
O coração proláptico, que ainda vive.
A esta tão somente – “somente”.
Aquela todas as horas de meus dias soturnos.
Todas as traças de nossos sofás.
A mim, um corpo adormecido,
Por milênios à espera,
Para que fosse posta em flamas
Uma vela vermelha ao teu contato
Com as cicatrizes de minha carcaça.
Éramos apenas febre,
Comoção tenaz,
Ao passo mínimo dos pés
Enlaçados naquele ritmo
Único,
Que punham nos olhos meus,
O nunca visto – tu.


BM

Um comentário:

Anônimo disse...

Interessante essa descrição do amor,da cena de um amor físico que ultrapassa o físico e é todo um jogo de luz e sombra:malvadeza X terna, levemente coradas X branco quase marmóreo,arvoredos X parques desmatados,dói X traz à tona as alegrias,juventude X envelhecida.Bela história de amor,feita de claro e escuro.